Vida em Verso e Prosa

Tenho escrito muitas coisas, algumas impublicáveis. Estas, são as mais interessantes.

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20 outubro 2013

O Obelisco


O obelisco

Numa praça de Bucareste existe um obelisco de mármore branco que trespassa uma coroa de vime preto. Do encontro entre branco e preto a representação vermelha de sangue escorre. Ao lado, uma parede em forma de muro em semicírculo com milhares de nomes.

Tentamos perguntar a um transeunte, mas ele não soube dizer o que significavam os nomes, nem qual sua relação com o monumento.

À noite, durante o jantar, fui colocado ao lado de um romeno chamado Sergiu (com u mesmo), uma pessoa muito culta, de conversa agradável. Resolvi, então, perguntar a ele sobre o monumento e seu significado.

– Em frente ao obelisco existe um palácio, no qual ficava o ditador Nicolae Ceausescu. Um dia, no final de 1989, a população ocupou a praça, num protesto contra a situação que vivíamos, pedindo mais liberdade. A polícia tentou esvaziar a praça, mas o povo não se retirava. Então o presidente deu ordem para que se abrisse fogo. Os soldados começaram a atirar, mesmo assim o povo não se movia. Era melhor morrer que continuar naquela situação. Na medida em que as pessoas foram caindo e o sangue escorrendo pelo chão, uma metamorfose se operou. Aqueles soldados também eram povo e haviam sido treinados para proteger as pessoas que estavam matando. É provável que tenham reconhecido alguns rostos na multidão como seus parentes e amigos. O fato é que, de repente, os soldados se viraram para o palácio e passaram a proteger o povo.  Esse mesmo sentimento foi contagiando os demais soldados, até que só restou a guarda do gabinete presidencial a proteger o ditador. Naquele dia ele foi derrubado e logo depois condenado à morte. Aquele obelisco foi construído para homenagear os mortos, cujos nomes estão gravados no muro.

– Você deve ter perdido amigos nesse dia, não?

– Até hoje eu escuto o zunido das balas em meus ouvidos. Eu estava lá e só não morri por mero acaso, pois vários amigos tombaram ao meu lado. Acho que todos nós morremos um pouco naquele dia.